Em pesquisa com 3.501 jovens (de 15 a 24 anos) de todo o Brasil, o tema drogas foi citado espontaneamente por um em cada quatro (24%) como “o problema que mais preocupa atualmente”, atrás apenas de segurança/violência (55%) e de emprego/trabalho (52%). A questão das drogas destacou-se ainda entre os “assuntos que mais interessam” (32%), junto com sexualidade (29%), depois de esportes (39%) e educação (66%), entre dez temas sugeridos. Ficou em primeiro lugar (46%), com sexualidade (45%) e esportes (43%), como “assunto para discutir com os amigos”; em segundo (52%), depois de educação (61%), como o “que gostariam de discutir com os pais”; e de novo em segundo (42%) como “mais importante a ser discutido pela sociedade”, com desigualdade/pobreza (45%) e política (41%), após educação (50%).
Sete de cada dez jovens (72%) disseram conhecer quem fume maconha e um em cada três (32%) quem use cocaína; 63% teriam visto alguém fumando e 24% cheirando; 37% afirmaram que alguém já lhes ofereceu cannabis e 14% coca; 17% teriam pegado na mão e 10% confessaram já ter provado maconha; 6% já teriam segurado e 3% experimentado cocaína. Claro que, sendo a pesquisa domiciliar, apesar do compromisso de anonimato, o peso moral e o risco criminal de assumir um ato ilícito obriga-nos a tomar esses dados criticamente. Se incluem os que de fato teriam provado só uma vez, certamente excluem os que temeram assumir ainda que a parte menor do que pode ser um hábito freqüente. Uns pelos outros, parece razoável considerar as taxas de usuários aparentemente eventuais como medidas aproximadas do uso corrente.
A Lei nº 11.343/06 despenalizou relativamente o porte e cultivo de drogas ilegais para uso próprio: manteve as penas de reclusão e detenção para o tráfico ilícito e reservou aos consumidores só a prestação de serviços à comunidade e programas educativos. A distinção entre tráfico e consumo pessoal – alterando entendimento vigente desde a edição do Código Penal, em 1940 – foi um avanço. Mas o uso de substâncias ilícitas permanece criminalizado, e o enquadramento em tráfico ou consumo, à mercê do arbítrio de delegados e juízes.
Se estimamos que entre esporádicos e contumazes 10% dos jovens brasileiros fumam maconha e 3% usam cocaína, em observância à lei devemos reivindicar recursos para a polícia investigar, a Justiça julgar e o sistema prisional abrigar, ao menos em parte, 3,5 milhões de jovens usuários de maconha e 1 milhão de cocaína (e, como a lei deve ser igual para todos, há de contar ainda os “drogadictos” adultos acima dos 24 anos). Ou seja, por quantas vezes queremos/podemos multiplicar nossos sistemas policial, judicial e penitenciário?
Opção mais sensata é mudar a política para o consumo de drogas do campo criminal (enfoque estadunidense, aqui reforçado pela ditadura) para o da saúde pública (enfoque europeu). Bom senso partilhado pela maioria dos jovens brasileiros: 77% preferem que “consumidores de drogas recebam tratamento médico, em vez de ir para a prisão”, contra apenas 13% a favor de que “continuem sendo presos” (8% apóiam as duas medidas).
A descriminalização do porte e cultivo de drogas para uso pessoal teria evidente impacto sobre a dinâmica do tráfico, a espiral de violência e mortes, o ganho financeiro do crime organizado e o contexto de corrupção policial e política em que se desenvolve. Através da Conferência Nacional da Juventude e do Congresso de Juventude do PT, o governo Lula e o Partido dos Trabalhadores têm a oportunidade de se colocar na vanguarda dessa discussão.
Gustavo Venturi, sociólogo e cientista político ([email protected])