O debate central é o mesmo: reconhecer os jovens enquanto sujeitos de direitos
O debate central é o mesmo: reconhecer os jovens enquanto sujeitos de direitos
[nextpage title="p1" ]
São movimentos em torno da solidariedade, de defesa ambiental, grupos que se orientam pelo lugar social, pelas modalidades esportivas e culturais, sobressaindo o hip-hop como a maior expressão de cultura de rua nesse contexto. Veem-se ainda movimentos em torno da sexualidade, da saúde, da luta por moradia, de portadores de deficiência, de mulheres, bem como associações e cooperativas diversas, organizações não governamentais (ONGs), jovens mobilizados em torno da agricultura familiar e as secretarias de juventude no âmbito dos partidos políticos.
Todos anunciam, para além de suas bandeiras específicas, um debate central: o reconhecimento dos jovens enquanto sujeito de direitos. Um debate, em essência, que incita o poder público, mas também passa a ser tema de interesse acadêmico e de desafio para os referidos movimentos e organizações sociais e, por que não dizer, para as juventudes partidárias.
Ao pensarmos em relação aos últimos dez anos, é possível delimitar a existência mais frequente do debate público sobre juventude, principalmente no âmbito das formulações, bem como algumas ações para o segmento.
Esse reconhecimento se dá em detrimento do alto contingente demográfico da população juvenil nos últimos anos exposto ao cenário de vulnerabilidade social e à necessidade de inserção desses jovens num circuito de construção de uma vida melhor. Assim, tal cenário aparece na pesquisa sobre juventude, violência e vulnerabilidade social na América Latina, que percebeu três importantes dimensões:
· A crescente incapacidade do mercado de trabalho de absorver indivíduos pouco qualificados ou com pouca experiência, como é o caso dos jovens;
· As dificuldades enfrentadas pelos governos na América Latina em reformular sistemas educacionais para que acompanhem as mudanças da sociedade e incorporem as novas aptidões e habilidades requeridas;
· As tendências no quadro cultural contemporâneo, que por um lado estimulam a sexualidade precoce e, por outro, incentivam as resistências em educar e oferecer meios para evitar que tal atividade favoreça a gravidez não planejada e o contágio de doenças sexualmente transmissíveis (ABRAMOVAY, Miriam et alii. Juventude, violência e vulnerabilidade social na América Latina, UNESCO, BID, Brasília, 2002).
Assim, o pensar sobre as condições de existência e vivência juvenil de forma ampla e não apenas como transição para a vida adulta remete a um olhar sobre a necessidade de deixar a escola, o fato de começar a trabalhar, sair da família de origem, ter filhos, bem como se relaciona com a cultura e o lazer numa fase propícia a vivências de diversão e entretenimento.
[/nextpage]
[nextpage title="p2" ]
Como conciliar desejos e necessidades no contexto de vulnerabilidade social enfrentado pela juventude brasileira? Vários elementos podem ser apontados como pistas para o debate em torno das Políticas Públicas de Juventude (PPJ) no Brasil.
É preciso considerar que tal debate veio a público na década de 1990, a partir da contribuição dos movimentos citados anteriormente, mas também de pesquisadores, organismos internacionais e gestores municipais e estaduais, que passaram a inserir a pauta no cenário público.
Ainda de forma preliminar, e na maioria dos casos pouco estruturados, diversos municípios brasileiros constituíram assessorias, coordenadorias, secretarias e programas no âmbito do Poder Executivo com atribuições específicas de atendimento a demandas dos jovens.
Tendo como referência a história recente, os anos de 2003 e 2004 podem ser considerados um marco importante. Em torno do tema juventude, mobilizaram-se a sociedade civil, o Legislativo e o Executivo. Entre as várias iniciativas, além das da Unesco, das ONGs e das universidades, que já vinham produzindo sobre o tema, destacou-se o Projeto Juventude, realizado pelo Instituto Cidadania, que elaborou uma ampla pesquisa ouvindo jovens, fazendo interlocuções com movimentos sociais, além de livros e um importante documento sobre a constituição de uma política nacional.
Nessa pesquisa, registram-se dados marcantes sobre a vulnerabilidade juvenil. Conforme dados da Pnad de 2001, dos jovens de 16 a 24 anos, 21% apenas estudam; 5% estudam e procuram emprego; 19% estudam e trabalham; 35% apenas trabalham; 6% não estudam e procuram emprego; e 14% não estudam, não trabalham, nem procuram emprego. Menos da metade dos jovens estuda, ou seja, 45%, enquanto 65% estão no mercado de trabalho 54% ocupados, 11% procurando emprego e apenas 24% na interseção, isto é, estudam, trabalham e procuram emprego.
Para o Projeto Juventude, esses dados revelam que os jovens brasileiros enfrentam graves problemas de exclusão escolar, assim como necessidades e dificuldades frente ao mercado de trabalho. Cabe salientar, ainda, que o mais alto grau de exclusão social se expressa na situação dos jovens que não estudam, não trabalham, nem procuram emprego, representando 14% do total, ou seja, um número próximo a 5 milhões.
Cruzando os acontecimentos, entre diagnósticos e ações de enfrentamento a esse processo de exclusão juvenil na esfera do Poder Legislativo, constituiu-se a Comissão Especial de Políticas Públicas para a Juventude da Câmara Federal, que realizou diversas audiências públicas, encontros regionais, uma conferência e um seminário nacional que já dialogava com a bandeira de reconhecimento desse segmento juvenil no que se refere a direitos sociais e políticos.
A eleição do presidente Lula é considerada um marco na luta pela garantia do reconhecimento de direitos desse público. Em 2004, sob a coordenação da Secretaria Geral da Presidência da República, nasceu o Grupo Interministerial, que reuniu dezenove ministérios e produziu um amplo diagnóstico e propostas para uma Política Nacional de Juventude.
É preciso registrar que entre as propostas apresentadas pelo referido grupo, estava a criação da Secretaria Nacional de Juventude, ocorrida em 1º de fevereiro de 2005. Vinculada à Presidência da República, sua missão é articular com os diversos ministérios a implementação de programas que enfrentariam os problemas que atingem os jovens.
Some-se ainda a esse momento histórico a criação do Conselho Nacional de Juventude (Conjuve), com a posse de seus sessenta membros em 2 de agosto de 2005. Enquanto a secretaria responde diretamente pelo Programa Nacional de Inclusão de Jovens (Projovem), em conjunto com diversos ministérios, o Conjuve constitui o órgão consultivo que envolve o poder público e a sociedade civil, em toda a sua diversidade.
Em decorrência do fortalecimento desses espaços e também da grande dimensão que a participação social ganha no governo Lula, em 2008 ocorreu a Conferência Nacional de Juventude, um importante avanço para a criação de espaços de participação política dos jovens e suas organizações. Dela saíram 22 bandeiras prioritárias dos jovens brasileiros, além de uma agenda de fortalecimento do tema no país, como o Pacto pela Juventude, que apresentou a necessidade de os candidatos municipais assumirem essa pauta, bem como a PEC da Juventude, promulgada em 13 de julho de 2010, que incluiu os jovens na Constituição Federal.
Foram muitas as conquistas, ao longo dos últimos anos. O Projovem avança no tema juventude desde seu nascimento e, em 2008, fortaleceu-se com o lançamento do Projovem Integrado, surgido da união de outros seis programas voltados para o segmento. É preciso compreender a inclusão de milhares de jovens, com o aumento de sua escolarização no ensino fundamental, sua qualificação profissional e sua cidadania como resposta aos desafios apontados pela juventude, sobretudo no que diz respeito à educação e à inserção no mercado de trabalho.
Entretanto, para o aprofundamento do acesso aos direitos juvenis, é preciso centrar forças na consolidação dessas políticas para que se tornem políticas de Estado.
É imperioso incorporar às políticas já existentes um viés inovador e sustentável para que esses direitos de fato sejam permanentes para as gerações presentes e futuras.
Diante disso, o binômio educação-trabalho deve ser compreendido como central nesse debate, bem como parte do processo emancipatório da juventude. Será necessária a ampliação do Projovem para o ensino médio, através de uma nova modalidade que seja capaz de articular conclusão do curso, formação profissional, transferência de renda e o desenvolvimento da participação cidadã.
[/nextpage]
[nextpage title="p3" ]
Outros grandes desafios são: integrar e fortalecer a juventude de territórios urbanos e rurais; a política cultural, o acesso e a produção de bens culturais, por meio do financiamento direto dos jovens, da construção de equipamentos públicos de difusão cultural (cinemas e teatros, centros culturais e bibliotecas); ampliação do acesso dos jovens à rede pública de saúde, contemplando as especificidades desse segmento, por meio de uma política nacional de saúde preventiva, com prioridade à prevenção do uso de drogas, com a implantação de centros públicos, prevenção e/ ou assistência nos casos de gravidez indesejada, e redução do número de mortes por causas violentas; a política de esporte nas comunidades, por meio da estruturação de espaços públicos, produção e distribuição de equipamentos, e o incentivo aos programas de desenvolvimento esportivo, assim como promover a participação da juventude nos programas relacionados aos grandes eventos esportivos (Copa do Mundo e Olimpíada); as políticas de combate à discriminação e de valorização da diversidade com recorte de gênero, étnico-racial e de diversidade sexual; as políticas de segurança que incorporem as especificidades da juventude na prevenção, na interação com os operadores de segurança pública e no combate qualificado à violência, garantindo ao jovem seu desenvolvimento saudável e seguro. Por fim, é preciso avançar na política institucional, aprovando o Plano e o Estatuto da Juventude, fortalecer a Secretaria Nacional de Juventude, garantindo seu papel de organismo executor, coordenador e articulador da Política Nacional de Juventude, e investir na criação de uma política de participação democrática, fortalecendo a rede do Conselho Nacional de Juventude e a Conferência Nacional de Juventude. Todos esses elementos já estão sendo debatidos pela juventude brasileira, sobretudo a juventude inserida nos movimentos e organizações. Todavia, é preciso dar visibilidade a essas ações e perspectivas para que as bandeiras de luta por mudanças na vida dos jovens seja também um pacto de toda a sociedade brasileira com essa geração, para que outras gerações se afirmem cada vez mais como sujeito de direitos.
O alcance dos programas
Maria Divaneide Basílio integra o Fórum Cone Sul de Jovens Mulheres Políticas (Forito) e o Conselho de Redação da Teoria e Debate
Murilo Amatneeks é coordenador de Políticas Públicas de Juventude da JPT
Severine Macedo é secretária Nacional de Juventude do PT
[/nextpage]