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Guaribas, cidade escolhida para o lançamento do programa Fome Zero, tinha o mais baixo índice de Desenvolvimento Humano entre todos os municípios do Brasil

Depositário da esperança da maioria dos piauienses, o petista Wellington Dias venceu as eleições de 2002 ao governo do Piauí com o propósito de elevar a auto-estima da população. Filho de agricultores de Oeiras, cidade do sertão do estado, bancário, o ex-vereador, deputado estadual e federal venceu em primeiro turno Hugo Napoleão (PFL), que tentava a reeleição, por 50,9% contra 44% dos votos válidos. Numa coligação que englobava PCdoB, PL, PMN e PCB, o PT ganhou a eleição praticamente no vácuo deixado pelo desgaste sofrido pelo PFL e pelo PMDB, após a cassação do governador Mão Santa.

Se perguntarmos a qualquer brasileiro qual o estado mais pobre da Federação, muito provavelmente ele responderá que é o Piauí. “É o estado mais atrasado do país. Estamos trabalhando para transformar isso e quebrando todas as tradições da política aqui, um histórico de falta de planejamento. Quando assumimos, tinha um déficit de aproximadamente R$ 120 milhões por ano, na época 8% da receita corrente líquida. O estado arrecadava mais ou menos R$ 1,5 bilhão e gastava mais de R$ 1,6 bilhão, em dados de 2002”, diz o governador. Não eram pagos a folha salarial, o décimo terceiro salário, encargos sociais, dívidas, não se cumpriam os contratos com os fornecedores. A dívida reconhecida era de mais ou menos R$ 2,7 bilhões.

Sob a bandeira do desenvolvimento e da erradicação da pobreza, a solução possível era buscar parcerias, integrar esforços do governo federal, estadual e municipal, compartilhado com trabalhadores, empresários e novos investidores. Era preciso prestar melhores serviços à comunidade e criar uma rede de proteção aos mais pobres.

Em janeiro de 2003 Lula foi ao Piauí lançar o Programa Fome Zero. A cidade escolhida, Guaribas, tinha o mais baixo Índice de Desenvolvimento Humano entre os municípios pobres do Brasil; 75% da população com mais de 15 anos era analfabeta; a mortalidade infantil estava em torno de 60 por mil nascidos vivos; apenas nove, de cada 1.200 casas, tinham banheiro e somente uma dispunha de água potável.

Wellington Dias reafirma o discurso presidencial. “Era preciso universalizar o alimento, como diz o presidente. Todo brasileiro tem de tomar café, almoçar e jantar todo dia. Isso hoje é praticamente uma realidade no Piauí. Não temos mais saques a armazéns, veículos carregados de alimentos, como havia antes, nos períodos de irregularidades de chuva e estiagem.” Aproximadamente 55% da população é atendida pelo Bolsa-Família, 300 mil famílias, quase 1,5 milhão de pessoas. São cerca de R$ 300 milhões que ingressam na economia do estado por intermédio desse programa.

A Coordenadoria da Segurança Alimentar e Erradicação da Fome tem a função de articular no estado o conjunto de programas envolvidos no Fome Zero, que é composto por mais de trinta ações, das quais o Bolsa-Família é a principal. Para a coordenadora Rosângela Sousa Sobrinho, a singularidade do programa no estado é a preocupação em ampliar o ensino fundamental e médio, além das condicionalidades ligadas à Secretaria da Saúde, como vacinação, pré-natal. Ao todo são 32 programas que atuam para erradicar a pobreza, entre eles, restaurante popular, Seguro Safra e o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), construção de cisternas, hortas comunitárias, capacitação e qualificação profissional, educação alimentar e nutricional (Sábia), proteção à criança e ao adolescente.

Sobre Guaribas, a cidade-piloto do programa, ela acrescenta a importância da construção de cisternas para garantir acesso a água, uma das maiores carências da comunidade. A água continua pouca, embora a Águas e Esgotos do Piauí (Agespisa) tenha construído duas adutoras: uma de 1,5 quilômetro de extensão, para captar o líquido de um olho-d’água, e outra de 60 metros, para puxar água de uma lagoa barrenta bem no meio da cidade. O balanço possível hoje é que, além das iniciativas governamentais para circular algum dinheiro na cidade, a iniciativa privada tem feito investimentos – há hotel, rádio comunitária e até uma unidade do Sesc. Atualmente, mais de 50% dos moradores estão cursando alguma modalidade de ensino, segundo a Fundação Centro de Pesquisas Econômicas e Sociais do Piauí.

A dívida do país com o estado

O Brasil tem uma grande dívida com o Piauí. De toda a infra-estrutura necessária ao desenvolvimento, o estado é o mais atrasado, o que tem menos energia, rodovias, pontes, aeroportos, gasoduto, ferrovia, hidrovia. “O Piauí entrou numa crise grande após o fim do ciclo agroexportador do babaçu e da carnaúba e vivíamos um período que chamava integração reflexa – o período de desenvolvimento que vem desde Juscelino Kubitschek e se intensificou no milagre brasileiro do Médici, proporcionando infra-estrutura econômica ao país. No Piauí não mudou nada: não tivemos a modernização da economia nem nenhum grande projeto de intervenção das empresas estatais. Sempre dependemos de transferência do governo federal para os vários programas nas áreas públicas. Isso deu um poder de manipulação muito grande a quem esteve no governo”, explica o deputado estadual Antonio José Medeiros, secretário de Educação até março último.

Segundo o governador, o presidente Lula está pagando a dívida dos que governaram o Brasil ao longo desses 500 anos. O governo federal recuperou praticamente todas as rodovias federais no estado, 2.022 quilômetros, e com o repasse dos recursos da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) o governo estadual está recuperando a malha sob sua responsabilidade. Por intermédio do programa Luz para Todos, o governo Lula está investindo R$ 2,1 bilhões no estado, onde 70% dos habitantes viviam sob luz de lamparina. Até o final do ano serão cem municípios com energia elétrica. Na área da saúde, o Programa Saúde da Família já cobre todos os municípios, assim como o Programa de Saúde Bucal, que soma 720 dentistas.

Na opinião de Wellington Dias, a aprovação do governo Lula pela maioria do povo brasileiro se justifica por projetos dessa natureza. “Em Guaribas, entreguei a uma mulher com cerca de 70 anos seu registro de nascimento e a identidade, e o marido dela da platéia gritou: ‘Governador, agora minha mulher tá emplacada, vou poder emplacar meus filhos e meus netos’. Se aquela mulher viesse a falecer um dia antes, ela não existiria do ponto de vista da organização da sociedade. E ela não tinha acesso à aposentadoria, ao Bolsa-Família, não tinha acesso a nada, porque não existia do ponto de vista legal. São coisas como essa que fazem a diferença.”

Sustentação

O grande desafio desde o início é a relação com os outros poderes, o Judiciário, o Tribunal de Contas. “À medida que fomos nos fortalecendo entre outras forças vivas da sociedade, a relação com essas instituições foi ficando mais fácil; nós chegamos ao governo, mas não chegamos ao poder. Essa é uma constatação clara.” A base de apoio do governo é formada por um bloco de onze partidos. São dezoito parlamentares, dos trinta da Assembléia Legislativa, dos quais apenas quatro do PT. “Mantemos uma relação madura com a oposição, porque fazemos um governo que a população compreende, nossa aprovação está em torno de 60%”, diz o governador.

Nem sempre as pesquisas foram tão favoráveis. Em 2004 quase 50% da população avaliava mal o governo. A justificativa foi uma amarga reforma administrativa com redução de funcionários, secretarias. Foram encerrados cerca de 35 mil contratos, realizados pelo governo anterior às vésperas das eleições de 2002; dos mais de 12 mil cargos em comissão ficaram menos de 3,5 mil; das 24 secretarias restaram 13. Na educação, o novo sistema de eleição para diretor de escola e o curso de gestão escolar acabaram com a indicação política.

O governo foi desde o primeiro momento apoiado pelo PMDB, com sete deputados estaduais, mais os parlamentares do PSB, do PDT e até do PP, em certos momentos. Em 2005, das 48 mensagens encaminhadas para o Legislativo, 42 foram aprovadas. Segundo o deputado Olavo Rabelo, líder do governo na Assembléia, a dificuldade maior é ideológica, porque, mesmo apoiando o governo na questão administrativa, os deputados polemizam e atacam o PT. Dois aliados importantes são os deputados peemedebistas Kleber Dantas Eulálio, ex-secretário de Governo que retornou à Assembléia, e o presidente da Casa, Themístocles Filho, apoiado pelo governo para assumir o cargo.

O momento mais difícil foi na reforma administrativa do estado. Foram retirados alguns “direitos” dos trabalhadores: mecanismos corporativos, clientelistas, como vinculação salarial, incorporação irregular de salários, salários de “marajás”. Para a deputada petista Flora Izabel, líder do governo por ocasião da reforma, a discussão e aprovação de nova organização administrativa abriu caminho para trabalhar a questão de investimentos e apresentar propostas concretas de desenvolvimento do estado.

A ponte entre governo e movimentos sociais é de competência da Superintendência de Relações Institucionais e Sociais, que atua nas negociações com servidores, relações com o movimento popular, igrejas, associações, federações de moradores (são quatro federações) e ONGs. Com a interlocução com os servidores mais qualificada, a maior demanda vem dos movimentos de moradia das áreas urbanas, principalmente Teresina, Picos, Parnaíba, Floriano, Esperantina. São 48 ocupações, áreas em conflito, segundo o superintendente Marcelino Fonteles. “No geral, as soluções têm sido quase consen­suais. Temos conseguido, dentro das demandas apresentadas pelos movimentos populares e das possibilidades do governo, chegar a um entendimento.”

A relação com o MST tem sido sem conflitos, uma vez que o conjunto dos programas implementados no meio rural contempla uma política de reforma agrária, incentiva a permanência do homem no campo, construindo moradias, levando energia, assistência técnica, água. Nesse sentido interagem governo federal, estadual, municípios e movimentos. A Contag e o MST têm bases efetivas no estado.

Medidas amargas

Secretária de Administração no governo e presidente do PT estadual, Maria Regina Sousa foi convocada doze vezes pela Assembléia Legislativa, durante a reforma administrativa. “Essa reforma foi a organização do Estado, antes era um caos. Ninguém sabia o tamanho do Estado.” Funcionários eram nomeados para cargos que não estavam previstos em lei. A folha de pagamentos era praticamente manual, no sistema não havia CPF dos funcionários. Quando realizado o recadastramento, a descoberta: servidores com cinco contas-salário que não trabalhavam em lugar nenhum. E ainda havia servidor que trabalhava havia mais de vinte anos e não constava de nenhuma lista, mas tinha contracheque. Não havia concurso público nem carreira. O funcionário que trabalhava como bibliotecário, por exemplo, não tinha ensino fundamental. “Logo nos primeiros dez dias de governo tivemos de demitir 14 mil pessoas, que estavam totalmente irregulares. Todo servidor ganhava salário mínimo, fosse engenheiro, fosse vigia. Enfim, acertamos as carreiras e fizemos muito concurso.”

Como o governo estadual se adequou ao organograma federal, reproduzindo a estrutura criada pelo governo Lula – por exemplo, uma Secretaria de Cidades, uma Coordenação do Fome Zero –, em 2004 a máquina ainda estava muito inchada e uma nova remodelação se fazia necessária, pois as finanças estavam desequilibradas, havia até atraso de salários. Um ano após a primeira reforma houve a extinção de secretarias, o enxugamento da máquina.

No fio da navalha

A arrecadação tem evoluído. Em 2002, 70% era proveniente de repasse federal, do Fundo de Participação dos Estados. Naquele ano, as principais receitas, o FPE e o ICMS, foram de R$ 902 milhões e R$ 540 milhões, respectivamente. Hoje há um crescimento real da arrecadação. Em 2005 a do ICMS aumentou para R$ 950 milhões e a do FPE chegou a R$ 1,1 bilhão. Segundo o superintendente de Despesa da Secretaria da Fazenda, Francisco José Silva, “a implantação do programa de modernização dos fiscos estaduais (Pnafe) deu certa tranqüilidade em termos de política de arrecadação. Esse recurso foi liberado através do Banco Mundial para modernizar a máquina fazendária, só faltava vontade política para aplicá-lo”. O estado adquiriu veículos com mecanismos de monitoramento, reformou os postos fiscais, equipando-os com computadores, integrou a rede de informações entre os que trabalham no trânsito, nos postos fiscais e nos veículos que ficam circulando nas fronteiras e nas cidades e investiu pesadamente na estrutura de informática.

No Piauí, a divulgação do dia do pagamento do funcionalismo vendia jornal. Todos corriam às bancas para saber quando iam receber. Desde 2005 os servidores recebem uma tabela anual, de janeiro a dezembro, que determina o pagamento do salário até o oitavo dia útil de cada mês. Trata-se de um grande avanço para uma economia que tinha como regra o atraso de salários. Isso não só motiva o servidor público estadual como também dá maior segurança à economia local.

O estado hoje caminha no fio da navalha. Pelo Sistema Integrado de Administração Financeira para Estados e Municípios (Siafem), a Fazenda monitora todo gasto e receita, que hoje estão empatados, em torno de R$ 2,6 bilhões, segundo dados do Relatório da Execução Orçamentária.

Área e população

Área: 251.529,186 km²

Número de municípios: 223

População residente: 2.843.278

População urbana: 1.788.590

População rural: 1.054.688

Municípios mais populosos: Teresina, Parnaíba e Picos

Os números da educação

A baixa escolaridade é um fato no Piauí. A população tem, em média, 4 anos e meio de estudo. Para efeito de comparação, em Santa Catarina, com praticamente a mesma população, o cidadão freqüenta a escola em média 8 anos. Em 2002, 31% da população era analfabeta, caindo em 2004 para 19%, com previsão de baixar para 9% no final deste ano. O programa Educação de Jovens e Adultos, parceria das três esferas de governo, igrejas, organizações não-governamentais e movimentos sociais, contabilizou de 2003 a 2005 mais de 400 mil inscrições. A meta é erradicar o analfabetismo até 2010.

Em matrículas no ensino fundamental, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2004 colocou o Piauí em primeiro lugar no Nordeste e em 18º no Brasil, com 98% das crianças de 7 a 14 anos freqüentando a escola. Também no ensino médio houve investimento. Nos últimos três anos o número de escolas públicas quase triplicou, de 154 para 430. A Universidade Estadual do Piauí tem 45 mil alunos em sala de aula, quase tanto quanto a Universidade de São Paulo, a maior do Brasil.

O governo priorizou a educação, destinando 39% de sua receita, como estratégia para a erradicação da pobreza. Além da universalização do ensino fundamental e médio – há ensino médio em todos os municípios –, e a alfabetização de jovens e adultos, a descentralização e a democratização da gestão escolar podem ser exemplificadas pela eleição de diretores e pelo funcionamento dos conselhos escolares, assim como pela valorização do magistério com formação inicial e continuada, ganhos salariais e plano de carreira. Uma das grandes batalhas na área foi convencer os prefeitos de que o ensino fundamental é tarefa dos municípios, ficando o estado com o ensino médio e universitário.

Desenvolvimento rural

A região dos cerrados tem grande potencial para algodão, cana-de-açúcar, soja, milho, sorgo, fruticultura. No entanto, a área mais rica do estado é a menos populosa, menos habitada e menos desenvolvida, sem estradas, energia elétrica, escolas etc. A atuação do governo tem se caracterizado por viabilizar a infra-estrutura para sua expansão. Com os incentivos dos últimos anos, houve um salto de 70 mil toneladas de grãos para cerca de 700 mil toneladas nessa região. Pela primeira vez o estado alcançou o patamar de 1 milhão de toneladas de grãos e também se destacou como um dos maiores produtores de mel no Brasil. Além da soja, um novo ciclo parece indicar que o algodão poderá despontar como outro produto importante.

O fomento à agricultura familiar e o incentivo ao pequeno produtor rural são a base de vários programas encampados pela Secretaria de Desenvolvimento Rural. Com o propósito de estimular o agricultor a produzir além de sua subsistência, o governo compra o excedente da produção, sem intermediários, e doa a famílias carentes de outra localidade. É o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) – Compra Direta, que redistribui quase cinqüenta produtos diferentes. “Como a produção de determinados alimentos no estado é regional, não há em todos os municípios, a secretaria, ao adquirir determinado alimento, deixa parte na comunidade carente local e transporta o restante para outras cidades”, diz o secretário Elcio Martins.

Com o PAA – Leite são atendidos aproximadamente cem municípios, com uma distribuição de 31 mil litros por dia. “Só sabe quanto vale um litro de leite para aquele necessitado quem tiver a oportunidade de presenciar a chegada do caminhão à comunidade, é uma verdadeira euforia”, constata o secretário. Os recursos dos governos federal e estadual empenhados para esse programa em 2006 ultrapassam os R$ 12 milhões.

O Pronaf registra no estado significativo aumento de recursos destinados a investimento e custeio da produção da agricultura familiar, acesso a terra, crédito e assistência técnica. Saltou de R$ 29 milhões (safra 2001-2002) para R$ 136 milhões (safra 2004-2005), segundo dados do Ministério do Desenvolvimento Agrário. Entre os convênios celebrados pelo Pronaf estão o incentivo à cajucultura e à produção de mamona como fonte alternativa de energia.

Apoio a projetos

O Projeto de Combate à Pobreza Rural (PCPR) orienta seus investimentos para a criação de infra-estrutura básica e geração de renda para as faixas mais pobres do meio rural. Na prática, as famílias se organizam em uma associação e apresentam suas demandas para a implantação de determinado projeto produtivo. Em geral, a reivindicação é por infra-estrutura, energia e água. Monitorado pela Secretaria de Planejamento, o programa movimentou cerca de R$ 44 milhões em dois anos (2003-2005), implantando cerca de 800 projetos. Até março já eram 1.100 projetos financiados nesse modelo e há sinalização para que seja renovado junto ao Tesouro Nacional por mais quatro anos, no valor de US$ 22 milhões, segundo o ex-secretário de Planejamento e atual secretário de Governo, Merlong Nogueira. “Todo esse recurso é empréstimo e terá impacto na dívida do estado. Temos consciência.”

Outro modelo de incentivo à produção é o Crédito Fundiário, programa do governo federal coordenado pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário, que é uma ação complementar ao Plano Nacional de Reforma Agrária. Ele prioriza o atendimento às famílias de pequenos produtores para aquisição de áreas entre um e quinze módulos rurais. As famílias pagam pela terra, mas recebem uma transferência que lhes permite entrar no assentamento com casa construída, água, energia e ainda financiar as primeiras atividades produtivas.

“Esse programa é uma conquista da Contag, ainda em 2001, no governo Fernando Henrique. No Piauí o encontramos com apenas 14 projetos inacabados. Já estamos com 220 projetos em funcionamento. Ao lado do PCPR, é hoje uma das principais ações do governo do estado na zona rural, porque leva um benefício concreto”, diz Merlong. O governo investe R$ 14 mil por família.

A parceria federal

Historicamente, o desempenho da economia no Piauí está condicionado ao repasse de verbas federais. Essa dependência das transferências da União constitui uma característica estrutural do estado, marcada por forte atraso social, econômico e tecnológico. Segundo consta no Balanço de Realizações do Piauí (2003-2005), 95% da receita do estado está comprometida com a folha de pagamentos, a dívida pública interna e externa e o custeio da máquina pública. Como então investir na ampliação dos serviços públicos para atender a uma população extremamente carente? Como implantar e melhorar a infra-estrutura socioeconômica essencial ao crescimento da economia?

Nesse aspecto as parcerias com o governo Lula são fundamentais e produziram bons resultados. “A política geral do governo Lula de tentar crescer gerando emprego e distribuindo renda beneficia muito estados como o Piauí, com economia frágil, uma vez que neles a proporção de pobres é muito maior. Mais da metade da população piauiense está no âmbito de atuação do Fome Zero. Por exemplo, a política de aumentar o valor real do salário mínimo não deve ter quase impacto em São Paulo, mas no Piauí tem. Eu diria que 90% dos nossos assalariados ganham ou o salário mínimo ou em torno dele”, afirma Merlong.

O Piauí vive um momento de dinamismo econômico que tem a ver com alguns grandes investimentos do governo federal. “Talvez a malha rodoviária do estado seja a melhor do Brasil. Há grandes investimentos da Eletrobrás, como a ligação da rede de distribuição do Nordeste com a do Norte e do Centro-Oeste. Vai ter uma rede de distribuição que captará energia de Itaipu e das hidrelétricas do Norte, além do Nordeste. Isso melhora a potência de energia de vários lugares, dando as precondições do Luz Para Todos”, acrescenta o deputado Antonio José Medeiros.

Esses investimentos em estradas, energia, educação são a infra-estrutura necessária para as atividades econômicas que vêm da soja, do biodiesel e daquelas cadeias produtivas familiares. Por outro lado, as ações de transferência de renda possibilitam a inclusão social de uma população que até então vivia em situação de risco.

A Pnad de 2004 também apontou crescimento da População Economicamente Ativa (PEA) do estado, de 60,5% em 2002 para 83,0% em 2004. Os bons resultados no Piauí, na verdade, melhoram as condições de vida da população, mas significam ainda a passagem da miséria para a pobreza.

Perspectivas eleitorais

O governador e sua equipe mostram-se confiantes na possibilidade de dar seqüência ao trabalho iniciado em 2003. Embora o estado seja pobre, a situação financeira seja apertada, conseguiram o equilíbrio sem ter de vender nada do patrimônio público, o que era usual nos governos anteriores. Na opinião do secretário Elcio Martins, que é do PSB, a imagem de Wellington Dias, de trabalhador humilde e digno, não foi atingida pelos problemas que o PT está vivendo na esfera federal. O governador teve o apoio – não formal – de partidos como o PSB e o PMDB desde o primeiro momento.

Em pesquisa divulgada em março, aproximadamente 70% afirmam que o governo traz desenvolvimento; cerca de dois terços aprovam o Bolsa-Família; mais de 60% reconhecem que é um governo que melhora a vida dos mais pobres. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2003 o Piauí foi o estado que apresentou o maior crescimento do PIB do Nordeste.

Está em curso a construção de uma frente ampla, que engloba até parcela do PMDB, e o entusiasmo com as pesquisas que indicam a reeleição de Lula é grande. “Temos orgulho de tudo que o governo federal está fazendo pelo Brasil e, do ponto de vista do Piauí, é importante a eleição do Lula”, finaliza o governador.

Rio dos peixes pintados

“Ocorreram no século 17 as primeiras incursões exploradoras ao território que é o espaço geográfico do Piauí de hoje. Foi o tempo da chegada das bandeiras entradistas, que, oriundas das regiões litorâneas da Bahia, São Vicente, Maranhão e Pernambuco, fizeram guerra de subjugação e extermínio às populações nativas e implantaram suas experiências de criação de gado e agricultura de subsistência.

No interior e zona central dessa nova área de exploração colonial, assentou-se em 1697 um núcleo ordenado de povoamento, a hoje cidade de Oeiras, ao mesmo tempo em que no extremo sul era fundada Parnaguá, e também se formavam as primeiras comunidades na região norte, no entorno da agora cidade de Piracuruca, proximidade da Serra da Ibiapaba.

A palavra Piauí deriva de um dos primeiros rios atingidos pela vaga colonizadora, subafluente do Rio Parnaíba, cuja bacia oriental é ocupada pelo hoje estado. Nesse entendimento, Piauí vem a ser rio dos Piaus, rio dos peixes pintados.” (Fonseca Neto, "O Piauí em Números, 2004, Fundação Centro de Pesquisas Econômicas e Sociais do Piauí.)

Rose Spina é editora de Teoria e Debate