O MST luta por objetivos simples de entender: reforma agrária, terra para viver e trabalhar. E dizem o que todos sabem: o agronegócio envenena os campos do país
O MST luta por objetivos simples de entender: reforma agrária, terra para viver e trabalhar. E dizem o que todos sabem: o agronegócio envenena os campos do país
A presença do Movimento Sem Terra nas ruas é tão significativa quanto a palavra que trazem na boca e as faixas que suspendem sobre a cabeça da multidão que mobilizam. Exigem terra, educação, saúde e cultura para os filhos
Eles não despertaram agora. Eles acordaram cedo, na história. E vêm de clara descendência: Palmares, Canudos, Contestado, Caldeirão, Porecatu, Trombas e Formoso, Corumbiara, Eldorado dos Carajás, para lembrar alguns lugares. Eles recolhem a memória das lutas e fazem delas suas próprias lutas.
Eles têm um rosto. Não o escondem. Têm bandeiras. E dizem ao poder o que desejam. Sua presença nas ruas é tão significativa quanto a palavra que trazem na boca e as faixas que suspendem sobre a cabeça da multidão que mobilizam. Lutam por objetivos simples, fáceis de entender: reforma agrária, terra livre para viver e trabalhar. Condições para produzir o pão que falta na mesa dos famintos. Exigem educação, saúde e cultura para os filhos. Oferecem a quem os visita, sem preconceito, sob o precário teto das barracas onde se organizam, o fruto do trabalho dos assentamentos: alimentos saudáveis. E dizem o que todos sabem mas viram o rosto: o agronegócio envenena os campos do país.
Aprenderam que a vida é bruta e que os donos da terra, de hoje, descendem dos senhores de escravos de ontem, e, com a máscara reciclada, monopolizam a terra e os recursos públicos para a produção; que os senhores das ondas magnéticas, que hoje se entregam ao crime de sonegar e manipular cotidianamente o direito à informação aos cidadãos, foram cevados à sombra da tirania, foram apoiadores e cúmplices da tortura, dos assassinatos, dos desaparecimentos, dos exílios.
Eles gritam há tanto tempo contra a falência da Justiça dos oligarcas, que seu clamor foi tragado pelo silêncio. E não se resignam. A quem prestam contas os encarregados de oferecer o serviço da Justiça? Que justiça se pode esperar das famílias que se apropriaram de um poder que escapa ao controle dos cidadãos?
Eles perguntam, com seu gesto, ao inundar de vermelho as ruas vazias: onde estão os outros companheiros de marcha? Onde estão os que recuperamos o espaço interditado das ruas e reconstruímos a dignidade da política como o instrumento mais elevado para construir os destinos coletivos? Onde estão os que venceram a barbárie da tirania que não se levantam contra a barbárie do mercado?
“Eles ataram no peito uma bomba que pulsa: o sonho da terra livre”. Eles denunciam com seu gesto os pequenos assassinos ocultos sob máscara, pagos – por quem? – a R$ 150 de soldo: somos gente da terra e do trabalho, temos a cara exposta ao sol e à chuva, viemos mostrá-la. O país nos conhece, temos bandeiras vermelhas que denunciam o crime do monopólio da terra e anunciam nos assentamentos de reforma agrária as inesgotáveis reservas de energia e esperança de nossa gente.
Eles nos lembram que, há cinquenta anos, a paralisia dos companheiros que se imaginaram no poder, nos conduziu a 21 anos de noite, no 1º de abril de 1964. Quem tenha olhos para ver que veja: as oficinas da noite não cessam sua feroz funilaria.
Pedro Tierra é poeta, acompanha o MST desde sua fundação